Heraldo Márcio Galvão Júnior e Arcângelo da Silva Ferreira

 A LITERATURA DE VIAGEM NO ENSINO DE HISTÓRIA: POSSIBILIDADES DIDÁTICAS

 

“As viagens são os viajantes. O que vemos, não é o que vemos, senão o que somos”.

Fernando Pessoa

 

Introdução

 

A historiografia brasileira utilizou, por muito tempo, o termo “viajante” para se referir aos estrangeiros que para cá vieram ou por aqui passaram e deixaram, de alguma maneira, relatos escritos e iconográficos sobre a natureza e sobre os costumes do Brasil. Ao lidar com essa documentação em sala de aula é importante, primeiramente, refletir sobre quem era este viajante e os significados de suas viagens. Homero, o viajante clássico e sua Ilíada, Estrabão e sua preocupação em representar o território, Humboldt, o naturalista aristocrata, e Saint-Hilaire, interessado na América, – para citar apenas alguns dos estrangeiros mais conhecidos – promoveram viagens, mas suas intenções políticas, sociais, culturais, científicas, históricas, entre outras, estavam longe de serem as mesmas.

 

Com o intuito de refletir sobre instrumentos metodológicos e didáticos para o ensino de história na educação básica e no ensino superior, este trabalho traz à tona uma fonte comumente conhecida pelos docentes:  documentos gerados a partir de viagens. O uso desta terminologia genérica é proposital haja vista que os termos viajante, viagem e diário são utilizados muitas vezes homogeneamente e sem suas especificações temporais e espaciais.

 

Quem era o viajante, de onde ele saiu, para onde foi, quem financiou suas viagens, a qual estrato social ele pertencia e em qual campos ele se inseria talvez sejam as primeiras perguntas a se fazer ao iniciar o processo de ensino-aprendizagem. Religiosos, comerciantes, artistas, naturalistas, cartógrafos, astrônomos, militares ou apenas aventureiros produziram, necessariamente, narrativas desiguais mesmo que fossem aos mesmos locais. A seleção de uma ou outra narrativa para se explicar o ambiente longínquo ou exótico faz parte de um processo de seleção da memória que inevitavelmente promoveu a cristalização de imaginários sociais. No caso brasileiro, muitos dos relatos dos viajantes estrangeiros do século XIX foram utilizados para se escrever a própria história brasileira, isto é, houve um processo de interiorização e construção da visão de si pela perspectiva do outro.

 

Como se pode perceber, as visões dos viajantes compiladas em diversos tipos de documentos revelam grande quantidade e variedade de suportes para se pensar a história, pois é comum que se encontre descrições de locais, desenhos de mapas, da fauna e da flora, fotografias e pinturas: testemunhos de uma época e suas representações (CHARTIER, 1991). Estas narrativas de viagens englobam, assim, diversos aspectos que transitam entre o científico, o topográfico, o pessoal e o antropológico. Nesse sentido, uma obra carrega tanto as intenções científicas quanto as representações pessoais e sociais de seus autores, tornando-se lugar importante para a reflexão histórica. Além disso, devido a suas características, tais fontes revelam possibilidades de empreender conexões interdisciplinares com a biologia, com a geografia e com a literatura.

Não sendo possível dissertar sobre todas estas relações nos limites deste trabalho, pretende-se compreender os aspectos literários de tais narrativas. Em outras palavras, como há várias especificidades nestes relatos, sugere-se especificamente o uso da categoria “literatura de viagem” no ensino de história, pois são obras publicadas a posteriori, com linguagem menos científica, voltadas para um público mais amplo, mas onde estão presentes, mesmo que de maneira rasa, diversos aspectos das localidades.

 

Literatura de viagem

 

Estas narrativas de viagens geram discussões acerca de suas tipologias desde a década de 1970. Jean Richard (1981) defende que elas devem ser consideradas como gênero multiforme, pois em cada tempo e espaço há a mudança dos estilos, dos objetos, da atenção e da redação dos escritores-viajantes. Já Wilma Peres Costa (2006) afirma que apodem ser agrupadas em três tipos: científicas, pessoais e à serviço do país. Mesmo podendo conter fragmentos dos três tipos em um mesmo relato, um deles se sobressai. Estes relatos são considerados como “gênero literário de fronteia” (CUNHA, 2012), pois transitam entre os gêneros diário de viagem, relatório e literatura. Estão na divisa de diários de viagens, pois são relatos, impressões e experiências próprias dos autores e balizam os relatórios devido a serem viagens à serviço do Estado que devem gerar subsídios para políticas públicas.

 

O caráter literário se dá pela existência de uma maneira de escrever própria, de intenções editoriais e da capacidade da linguagem em representar a realidade, construindo estereótipos e imaginários. Esta união entre ficção e realidade presente nos textos pode revelar, por meio de análises, sistemas de representações, sentimento de pertencimento, de estranhamento, projeções e crenças que dão ao relato um cunho autobiográfico haja vista que construir uma visão dos outros revela uma imagem de si. Além disso, força a memória a uma sequência organizada, linear, seguindo a cronologia dos acontecimentos, embora por vezes a memória possa trair inconscientemente, como já apontaram Le Goff (2000), Nora (1993) e Pollak (1992).

 

Philippe Antoine (1997) acredita que há nos textos a alternância não hierarquizada de sequências textuais, o que faz do viajante ao mesmo tempo narrador e personagem. A literatura de viagem carrega, da mesma forma, a memória do “vivido” e a memória do “lido” de seus autores na medida em que as vivências sociais, econômicas, políticas e culturais somam-se à bagagem de leitura do viajante, gerando uma imagem prévia do local para onde o viajante está disposto a ir, o que reflete no texto de seu diário (TOBAR, 2005). Catherine Le Pelletier (2016) chama atenção, entretanto, para a postura de diversos historiadores e antropólogos que se debruçam sobremaneira nas vidas dos viajantes ou nos lugares para os quais eles viajam e acabam se esquecendo que a construção do enredo da literatura de viagem é dependente da jornada e têm influência em seu meio. O real, a veracidade e o testemunho da jornada têm importância no texto pois constroem discursos (o visto, o experienciado, as observações botânicas, políticas, sociais, entre outras) que chegam ao leitor. Este, ao se debruçar sobre uma literatura de viagem, tem apenas uma experiência do real na medida em que entra em um processo de “vai e vem” de, pelo menos, duas realidades, afinal os relatos são compreendidos enquanto subjetividades do autor, um suporte informativo do mundo. Em vista disto, a análise documental deste tipo de fonte deve levar em consideração o leitor, o mercado editorial que absorveu esse tipo de produção e o sistema de representação e de referência do autor-viajante.

 

Estas viagens suscitam metáforas, gerando um manancial de símbolos que podem exprimir as ideias de vida e de morte. Morte como passagem, mobilidade ou deslocamento para regiões desconhecidas e vida como trajetória, caminho, peregrinação: “viagem, vida e morte são deslocamentos” (LEED, 1992, p. 36). O viajante entra no debate da década de 1990 enquanto discussão sobre estranhamento ou distanciamento como forma de conhecer (GINZBURG, 1998). Seus relatos são fontes importantes para serem utilizados no ensino de história, pois representam indícios que servem como chaves para o conhecimento das realidades, principalmente quando analisadas de maneira intensa e profunda.

 

Interessa aqui conjecturar sobre o significado da fotografia no processo de criação destas obras, pois que “a evidência histórica e a imagem são constituídas por investimentos de sentido e a fotografia pode ser um indício ou documento para se produzir uma história” (MUAD, 2012, p. 263). Assim, a fotografia não será tratada enquanto objeto de pesquisa, mas como indício para verificar como pessoas, paisagens e cidades são representadas pelos autores e, consequentemente pelo poder público, por meio da organização de determinados registros imagéticos. Por este pensamento, as fotografias podem ser compreendidas enquanto “documentos/monumentos, (pois) permitem-nos conhecer por ângulos poucos habituais a urdidura das relações sociais e experiências passadas, elucidando no presente sua alteridade” (MUAD, 2012, p. 280). Sugere-se que os autores utilizem, dessa maneira, a imagem fotográfica como espelho cultural que informa e constrói interpretações sobre os objetos e os sujeitos fotográficos (BORGES, 2011), isto é, a fotografia enquanto “mediação cultural” (WILLIAMS, 1992). Neste ponto, a narrativa discursiva é completada pela narrativa fotográfica (BARTHES, 2018).

 

Acompanhando as fotografias, os mapas aparecem com frequência nas obras dos autores. A ligação íntima com a geografia torna-se clara. Ora, para conhecer uma região e pensar em projetos públicos para ela, é necessário que se conheça seu território, sob a gerência do Estado. Na relação entre afirmação da nacionalidade e a construção do Estado, o tema identidade adquire valor em geografia com o conceito de território e de territorialidade. Território, em suas características físicas, pode ser circunscrito e delimitado como espaço sob domínio de um poder e a territorialidade tona-se uma estratégia poderosa para o controle de pessoas e de “coisas” através de controle de uma determinada área. Conhecer o território é conhecer e definir a si mesmo em parte e no todo, consagrando-se em alteridade, conhecer o outro (ALBAGLI, 2004).

 

A cartografia está em uma linha tênue entre a arte e a ciência e aqui será tratada enquanto tal. O mapa é uma representação de seu tempo, não sendo nem exato nem inexato e ao mesmo tempo as duas coisas. Ele é inexato por essência, natureza, pois pretende construir ou reconstruir um lugar, sendo considerado uma versão possível de um território (FONSECA, 2001). Utilizado pelos governos enquanto instrumento de poder, com seu contexto interno e externo, é uma operação retórica, um discurso que produz, constrói e revela intenções políticas. Logo, encaramos o mapa como texto por ser possível, a partir deles, identificar características físicas e sociais, lutas físicas, econômicas, políticas e religiosas (BESSE, 2001).

 

O sentido da história inscrito na “literatura de viagem”

 

Uma questão pertinente, quando a literatura dos viajantes é adotada como vestígio histórico, gira em torno do sentido de história registrado nos discursos dos viajantes do século XIX, por exemplo. Estes discursos estão balizados nas ideologias de um tempo, no qual as mentalidades estavam fundamentadas no cientificismo, com o significativo peso das Ciencias Naturais – essencialmente a Biologia – da qual conceitos, categorias eram usados para ler a Amazônia.

 

Através da literatura dos viajantes, portanto, é possível pensar sobre a relação Natureza/Cultura, pois as preposições levantadas pelos viajantes acabaram por interferir nos processos de produção de conhecimento dos saberes relativos às ciências humanas. Esse sentido da História impresso na literatura dos viajantes se tornou tão marcante que influenciou intelectuais brasileiros, aqueles que elegeram aspectos da Amazônia como objeto de seus interesses de estudo. Dentre estes está Euclides da Cunha.

 

Uma das primeiras interpretações sobre a Amazônia, amplamente divulgada no contexto de sua publicação, surgiu através das obras do literato Euclides da  Cunha – À margem da História e Amazônia – um paraíso perdido. Livros lançados, pela primeira vez, respectivamente, em 1909 e 1966, este último, inclusive, com publicação financiada pelo Governo do Estado do Amazonas. Os dois livros dialogam com a literatura dos viajantes e, em alguns aspectos, tecem alguns questionamentos, porém, ao fim e ao cabo, corroboram com as conclusões apresentadas pelos viajantes do século XIX: A natureza, na sua amplitude, acaba por determinar a trajetória histórica das populações que habitavam a região Amazônica. Portanto, nesse sentido dado à História, a Natureza se sobrepunha à Cultura. O óculos que Cunha usou desde a primeira década até os anos sessenta do século XX parecia ser o mesmo usado pelos viajantes naturalistas. O literato tomou-o emprestado. Para Cunha, analisando, por exemplo, a inserção dos seringueiros nordestinos que vieram à Amazônia para extrair o látex:

 

“o homem era um intruso que insolitamente chega. É o expatriado em sua própria pátria, o nordestino, aquele que trabalha para escravizar-se. [...]. As circunstâncias nas quais ele está inserido lhe deixam estéril, um nômade solitário diante da natureza estável [...], porque preso às amarras de seu destino, aliais, àquele paraíso perdido, sem história.” (FERREIRA, 2000, p. 48).

 

O sentido da história em Euclides da Cunha se assemelha às nuances inscritas nas dobras dos discursos de determinados naturalistas, como por exemplo, aquele registrado pela família Agassiz: “A mata é cheia de vida e de ruídos; o zumbido dos insetos, os sons estrídulos dos gafanhotos, o grito dos papagaios, as vozes inquietas dos macacos, tudo isso faz a floresta falar” (AGASSIZ, 1975, pp. 389-390). Observamos assim, um quadro amazônico onde a flora e a fauna aparecem majestosas; já o habitante da região é subsumido. Uma vez mais vemos a Natureza engolindo a Cultura. (FERREIRA, 2000, p. 45). Portanto, a herança da visão cientificista dos naturalistas se espraiou até os intelectuais brasileiros, interpretes da Amazônia.

 

Considerações finais

 

Vemos os viajantes através de suas experiências de viagens impressas na literatura deixadas por eles? As viagens são, de fato, os viajantes? Como argumenta Montaigne, numa ironia aos eurocentristas, “as pessoas dotadas de finura observam melhor e com mais cuidado as coisas, mas comentam o que vem e, [...]. Nunca relatam pura e simplesmente o que viram, e [...] deformam e ampliam os fatos” (MONTAIGNE, 1987, p. 258.). Fernando Pessoa, poeta português, usando de sua sabedoria suscita por meio de seus versos uma das peculiaridades do ofício do historiador: duvidar.

 

Ao lançarmos mão da literatura de viagem como documento (e nunca como um monumento), fazendo as perguntas corretas, podemos adotá-la como uma possibilidade para o Ensino da História. Neste breve artigo apresentamos alguns caminhos. Essencialmente, o uso dessa literatura para compreender os processos de interpretação da história da Amazônia.

 

Peculiaridade importante para estabelecer debates sobre uma consciência histórica face aos históricos problemas da referida região. Há uma ordem no discurso, inscrita na literatura dos viajantes. Ancorada numa herança ideológica. Esta que, mesmo na contemporaneidade, vaza suas sombras.  

 

Referências biográficas

 

Heraldo Márcio Galvão Júnior é docente na Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa). Graduado em História pela Unesp. Mestre em História pela Unesp. Doutor em História pela UFPA. Bolsista Prodoutoral CAPES. Bolsista do Programa de Doutorado Sanduíche CAPES - École des hautes études en sciences sociales/Paris. e-mail: heraldogalvaojr@gmail.com 

 

Arcângelo da Silva Ferreira é docente na Universidade do Estado do Amazonas. Graduado em História pela UFAM. Mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia pela UFAM. Doutorando em História pela UFPA. e-mail: asf1969@outlook.com

 

Referências bibliográficas

 

AGASSIZ, Louis e Elizabeth. Viagem ao Brasil: 1865-1866. Belo Horizonte, Itatiaia, São Paulo: EDUSP, 1975.

 

ALBAGLI, Sarita. Território e Territorialidade. In: AGES, V.; BRAGA, C.; MORELLI, G. (Org.). Territórios em movimento: cultura e identidade como estratégia de inserção competitiva. Rio de Janeiro: Relume Dumará; Brasília, DF: SEBRAE, 2004.

 

Antoine, Philippe. Les recits de voyage de Chateaubriand: contribution a l’etude d’un genre. Paris: Editions Champion, 1997.

BARTHES, Roland. A câmara clara: nota sobre a fotografia; tradução Júlio Castañon Guimarães. – [7. ed] – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2018.

 

BESSE, Jean-Marc; TIBERGHIEN, Gilles A; GLON, Eric. Opérations cartographiques. Arles-França: Actes Sud, 2017.

 

BORGES, Maria Eliza Linhares. História & Fotografia. 3ª ed. – Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2011.

 

CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Estud. av., São Paulo ,  v. 5, n. 11, p. 173-191,  Apr.  1991.

 

COSTA, Wilma Peres. Narrativas de Viagem no Brasil do século XIX – Formação do Estado e Trajetória Intelectual. (Org.) BASTOS, Elide, RIDENTI, Marcelo e ROLAND, Denis. Intelectuais e Estado. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006.

 

CUNHA, Euclides da. À margem da história. São Paulo: Lello Brasileira, 1967.

 

CUNHA, Euclides da. Amazônia – um paraíso perdido, Manaus: Editora Valer/ Governo do Estado do Amazonas/ Editora da Universidade Federal do Amazonas, 2003. 

 

CUNHA, Paula Cristina Ribeiro da Rocha de Morais. Apontamentos teóricos sobre Literatura de Viagens. Caracol, n. 3: (jan-jun 2012).

 

FERREIRA, Arcângelo da Silva. “Na vaga claridade do luar”: História & Literatura do Movimento Madrugada na cidade de Manaus (1954-1967). – 1ª. ed. – Curitiba: Appris, 2020.

 

FONSECA, Cláudia Damasceno. Pouvoirs, villes et territoires. Genèse et représentations des espaces urbains dans le Minas Gerais (Brésil), XVIIIe-début du XIXe siècle. 2001. Tese (Doutorado em História) - École des Hautes Études en Sciences Sociales, Paris, 2001.

 

GINZBURG, Carlo. Occhiacci di legno: nove riflessioni sulla distanza. Milano: Feltrinelli, 1998.

 

LE PELLETIER, Catherine. Littérature et société: la Guyane. Index toponymique et Table des matières détaillée, 2016.

 

LEED, Richard. La mente del viaggiatore: Dall´Odissea al turismo globale. Bolonha: Il Mulino, 1992.

 

MONTAIGNE, Michel Eyquem de. “Dos Canibais”. In.: Ensaios. 2ª. ed. Brasília, Editora Universidade de Brasília: Hucitec, 1987.

 

MUAD, Ana Maria; LOPES, Marcos Felipe de Brum. “História e fotografia”. In.: CARDOSO, Ciro Flamarion; VAINFAS, Ronaldo. Novos Domínios da História – Rio de Janeiro: Elsevier, 2012.

RICHARD, Jean. Les recits de voyages et de pelerinages. Brepols: Institut d’Etudes Medievales, 1981.

 

TOBAR, Leonardo Romero; ELDUAYEN, Patricia Almarcegui (orgs.). Los libros de viaje: realidad vivida y genero literario. Universidad Internacional de Andalucia: Ediciones Akal, 2005.

 

WILLIAMS, Raymond. Cultura. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

12 comentários:

  1. Muito interessante o texto e a proposta estabelecida.
    Pensar a literatura de viagem no ensino de história instiga a possibilidade não apenas do uso de fontes e da interdisciplinaridade entre história e literatura, e também outras áreas do conhecimento, mas também a possibilidade de analisar o passado histórico com perspectivas subjetivas dos viajantes, seus contextos e tempos.
    Nesse sentido, meus questionamentos são os seguintes:
    - Como trabalhar com essas fontes de forma que não se analise apenas os aspectos históricos e geográficos, mas também linguísticos?
    - Em suas práticas docentes, vocês já enfrentaram resistências dos alunos no trabalho com essas fontes?
    Agradeço a atenção.
    Sandiara Daíse Rosanelli

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    1. Olá Sandiara. Muito obrigado pela participação.
      Excelentes perguntas.
      1. No lidar com tais fontes é imprescindível que se tenha em mente que os campos disciplinares e intradisciplinares, como a geografia, a antropologia, a etnografia e a linguística, por exemplo, são auxiliares nos estudos históricos, portanto internos às análises. As literaturas de viagens são documentos riquíssimos para compreendermos tanto as questões linguísticas das diversas etnias com as quais os viajantes tiveram contato quanto os aspectos relacionados à lingua portuguesa ou então a mesclas culturais ou relacões de poder a partir de aspectos linguísticos. Portanto, uma análise em direção à linguística não deixa, necessariamente, de ser interpretada como aspecto histórico.
      2. Pelo contrário. Apresentar estas fontes aos discentes aflora a imaginação deles e a desconstrução de "verdades" torna o assunto tratado mais interessante.
      Atenciosaente,
      Heraldo Márcio Galvão Júnior e Arcângleo da Silva Ferreira.

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    2. Agradeço os esclarecimentos.
      Essas proposições ficarão em mente nos meus trabalhos com fontes históricas, tanto na área de história quanto da própria literatura e linguística. Além disso, as reflexões que vocês propõem vão me inspirar para o trabalho na docência com essa temática.
      Agradeço a atenção.
      Sandiara Daíse Rosanelli

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    3. Sandiara, colocamo-no à disposição para mantermos contato. Escreva-nos, por gentileza. Nosso e0mail está acima.

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  2. Muito interessante essa linha de pesquisa. Pensar sobre o olhar dos viajantes é uma forma de ver parte da realidade na qual eles estavam sendo inseridos. Quanto a isso eu tenho uma pergunta.
    Durante essas pesquisas são utilizados esses relatos, porém, sabemos que esses relatos eram feitos por pessoas que não faziam necessariamente parte daquela realidade (principalmente da região amazônica). Então, como não cair necessariamente na visão etnocentrismo de tais viajantes?
    Quais são os principais obstáculos que o pesquisador dessa área enfrenta?

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    1. Meu caro desconhecido, sugiro que refaça a pergunta assinando com seu nome completo, pois essa é a dinâmica do evento e assim garante a presença no simpósio.
      Sobre sua pergunta, uma questão importante é verificar a trajetória pessoal, política, econômica, cultural, intelectual e redes de sociabilidade do viajante com o qual pretende trabalhar. Isto ajudará a responder diversas questões e o afastar de leituras simplistas da fontes. Buscar as matrizes inelectuais do viajante, possuir uma base teórica profunda e ter o apoio de disciplinas, como antropologia, vistas por um viés histórico podem completar o quadro para que não se caia em etnocentrismos nem anacronismos.
      Esta resposta já completa a sua segunda pergunta.
      Obrigado pela participação. Espero ter sido claro. Se houver mais questões, colocamo-nos à disposição.
      Abraços
      Heraldo Márcio Galvão Júnior e Arcângelo da Silva Ferreira

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  3. O texto é empolgante, e traz à tona uma temática (relatos dos viajantes) pouquíssima aproveitada no Ensino de História, seja pela escassez de aulas nos currículos ou seja pelo simples desconhecimento dos professores de História. As abordagens que o texto traz, sobre importância das análises de outros campos que não apenas a História, nos apresentam a natureza complexa do conhecimento histórico, e assim deve ser pensado o Ensino de História – também a partir das representações e narrativas de viajantes, que impactaram sobremaneira a visão sobre as “brasilidades” e que, ainda hoje, são possíveis de serem percebidas. E como é importante revelar, o “viajante ao mesmo tempo narrador e personagem”. A pergunta que me ocorre fazer – dentre inúmeras reflexões que o texto suscita, é: também não seríamos nós, professoras(es) de História, narradores e personagens na sala de aula? E como estudiosos da História também do tempo presente, não seríamos “viajantes” de um tempo desconhecido, esse de pandemia e negacionismos? O texto de vocês é muito instigante, e quero pedir a permissão para compartilhá-lo em minhas aulas de Metodologia do Ensino de História e Geografia, no Curso de Pedagogia. Agradecida pela atenção! Ana Maria Brochado de Mendonça Chaves (UEMG)

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    1. Cara Maria Chaves, é um prezar enorme contar com suas considerações e perguntas. Muito obrigado. Acreditamos que o seu comentário vem complementar o texto e já não o vemos da mesma maneira, pois impossível cindi-lo da nossa narrativa. Acreditamos, assim como você, que somos narradores e personagens na sala de aula na medida em que, ao discutirmos sobre as sociedades e os homens no tempo, partimos de compreensões e problemáticas presentes em busca de respostas. Somos personagens por fazermos parte de um tempo e espaço, termos nosso lugar de fala e direcionarmos as perspectivas de análise com nossos alunos. Também somos narradores quando construímos um conhecimento em sala de aula a partir de bibliografia robusta e escolha de fontes ou instrumentos metodológicos. Já o tema do tempo presente se impõe também com clareza nesta perspectiva, pois é impossível não levar em consideração a pandemia, o negacionismo, jogos de poder pela vacinação, cultura do ódio, oposição às minorias, entre outras questões que nos coloca como personagens atuantes e em busca de narrativas históricas e historiográficas para melhor compreendermos, de certa forma, nosso presente.
      Será uma honra poder contribuir com as suas discussões em sala de aula a partir do nosso texto e, quem sabe, de outras maneiras também.
      Um grande abraço
      Heraldo Márcio Galvão Júnior e Arcângelo da Silva Ferreira.

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    2. Gostaria de pedir, por gentileza, que nos encaminhasse um e-mail para mantermos contato e discutirmos mais à fundo a temática.

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  4. Proposta sensacional para o ensino! A importância da literatura de viagem faz-se necessário como viés teórico-metodológico. O texto é embasado por diversos teóricos - excelentes referências - que o torna bastante acadêmico, num bom sentido. No plano metodológico que possibilidades didáticas vocês apontariam? Jessé Gonçalves Cutrim

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    1. Prezado Jessé, bom dia. Obrigado pelo comentário e questão.
      Primeiramente, gostaríamos de indicar a leitura de autores e autoras como Klaus Bergmann, Jorn Rüsen, Isabel Barca e Maria Auxiliadora Schmidt, pois tratam da complexidade da didática frente os novos tempos.
      Uma indicação didática pontual pode ser a comparação entre fontes. Pensamos, no momento, nas discussões sobre as representações do Brasil pelos estrangeiros em seus contextos cientificistas e/ou naturalistas e o brasileiros que os leram e narraram por meio da música.
      Além dos exemplos dados ao longo do nosso texto, imagine as inúmeras possibilidades de abordagens que a comparação entre a literatura de viagem e a música “O estangeiro”, de Caetano Veloso, podem trazer:
      “O pintor Paul Gauguin amou a luz na Baía de Guanabara/O compositor Cole Porter adorou as luzes na noite dela/O antropólogo Claude Levy-Strauss detestou a Baía de Guanabara/Pareceu-lhe uma boca banguela (...) Uma baleia, uma telenovela, um alaúde, um trem, uma arara/Mas era ao mesmo tempo bela e banguela a Guanabara/Em que se passara, passa, passará o raro pesadelo/Que aqui começo a construir, sempre buscando o belo e o amaro”
      Esperamos ter ajudado.
      Abraços
      Heraldo Márcio Galvão Júnior e Arcângelo da Silva Ferreira

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