Cristiano Nicolini

IDEIAS HISTÓRICAS SOBRE INTERCULTURALIDADE NUMA TURMA DE ALUNOS DO 9º ANO DA CIDADE DO PORTO – PORTUGAL

 

A interculturalidade é um tema que perpassa as questões ligadas ao ensino na atualidade, principalmente no campo das Ciências Humanas. Num contexto de globalização, é preciso olhar para o ser humano e para as sociedades a partir de uma perspectiva aberta às ideias de diversidade e universalidade. Nessa perspectiva, a Educação Histórica propõe investigar as ideias dos estudantes acerca da interculturalidade, tanto a partir de narrativas do presente quanto sobre o passado.

 

As múltiplas formas que o ser humano utiliza para dar sentido à história revelam uma relação entre as diferentes culturas e não uma comparação. Além dessa referência, esse texto parte também de trabalhos desenvolvidos pelas investigadoras Júlia Castro (2009; 2011) e Isabel Barca (2000; 2011; 2014; 2016), acerca das ideias tácitas dos alunos e das questões que envolvem a interculturalidade nas aulas de História.

 

Nesse sentido, a perspectiva intercultural se faz necessária para que as diferentes realidades escolares e para que os diferentes sujeitos que nelas convivem sejam compreendidos como protagonistas desse processo. Compreender a escola como um espaço de promoção da polifonia das narrativas históricas é um passo inadiável nesse momento histórico que vivenciamos.

 

Partindo destes referenciais, desenvolvemos uma atividade de investigação com um grupo de estudantes do 9º Ano de um agrupamento de escolas situado na cidade do Porto, norte de Portugal. Esse território, cuja fundação remete aos tempos da ocupação romana, até o final da Idade Média foi um local de disputas entre bispos e cônegos, clero contra reis, burgueses contra fidalgos. Num desses períodos de guerra, durante o século XIV, a cidade foi muralhada, mobilizando toda a população nessa tarefa. Tais acontecimentos foram desenhando uma urbanidade labiríntica, cujos contatos com o norte foram desenvolvendo o comércio e atraindo diferentes interesses ao longo da modernidade. Em 1820, a Revolução do Porto acabou se desdobrando em acontecimentos que aceleraram o processo de independência, assim como marcou a dinâmica da expansão napoleônica e dos chamados ventos liberais pelo mundo (DUARTE, 2001).

 

Hoje, a cidade do Porto se caracteriza pelos diversos espaços de memória, muitos deles restaurados recentemente, o que vem atraindo um grande número de turistas de variadas partes do mundo. Além de turistas, o local também se tornou importante polo de atração de mão de obra imigrante, dentre cujos grupos destaca-se a presença de brasileiros. Segundo informa um site sobre turismo na Europa, “[...] a cidade do Porto foi eleita o melhor destino europeu para conhecer em 2019” (Disponível em: <https://turismo.eurodicas.com.br/porto-eleito-o-melhor-destino-da-europa/>. Acesso em: 28 mar. 2020).

 

Partindo da ideia da História como construção situada no tempo e no espaço, selecionamos uma turma de estudantes do 9º Ano da Educação Básica para desenvolver uma investigação acerca das ideias de interculturalidade presentes em suas narrativas. Como essa pesquisa integra um trabalho mais amplo desenvolvido no Brasil, buscou-se um recorte temático que estivesse relacionado ao tema dessa investigação; ou seja, que correspondesse às representações da identidade regional no ensino de História.

 

Região e regionalidade são definições construídas historicamente. Não se limitam a nomear espaços naturais, pois compreendem as múltiplas interações entre o humano e o meio. Conforme evidenciam autores como Corrêa (1997) e Lencione (2001), podemos identificar a construção epistemológica desses conceitos geográficos desde o século XIX até o período recente.

 

Na perspectiva da Educação Histórica, o ensino de História Regional provoca novas reflexões sobre este tipo de abordagem. Neste sentido, ela deixa de ser somente uma metodologia ou “recorte” espaço-temporal, passando a compreender as relações entre as narrativas locais ou regionais e a consciência histórica. Em Portugal, país proporcionalmente menor em extensão territorial, a ideia de região tem menos força que no Brasil, consequentemente. Talvez os estudos sobre História Local tenham mais sentido que uma História Regional no país europeu. Por isso, a atividade desenvolvida na escola selecionada na cidade do Porto propôs aos estudantes que analisassem um conjunto de imagens referentes ao cotidiano das pessoas que vivem neste local. As imagens foram selecionadas a partir de sítios eletrônicos voltados ao turismo e à divulgação das potencialidades locais, formando um conjunto de seis imagens:

 


                                   

Fonte: <https://www.jornaldocomercio.com>. Acesso em: 12 fev. 2019.

 



Fonte: <http://www.clube-fitness.com>. Acesso em: 12 fev. 2019.

 



Fonte: <https://www.african-arte.com>. Acesso em: 12 fev. 2019.

 

 


Fonte: <https://pt.depositphotos.com>. Acesso em: 12 fev. 2019.

 

 


Fonte: <https://holidaysportugal.eu>. Acesso em: 12 fev. 2019.

 



Fonte: <http://www.all-about-portugal.com>. Acesso em: 12 fev. 2019.


 

Após uma breve apresentação sobre o significado das narrativas regionais no Brasil, destacando as diversas influências étnicas e culturais naquele país e a consequente construção de identidades regionais ao longo da história, solicitamos aos alunos que formassem cinco grupos. Em seguida, receberam um material em que constavam as seis imagens inseridas no quadro acima, porém sem a respectiva contextualização e identificação cultural.

 

Neste momento, os alunos discutiram o significado das imagens, fazendo as devidas associações e relacionando com as etnias ou povos que estariam, segundo eles, associados à origem e à presença desta manifestação cultural no Porto contemporâneo. Após esta primeira etapa, os alunos receberam as seguintes sentenças para que associassem ao conjunto de imagens analisado:

 

Enumere as ideias a seguir, usando a escala de 1 a 6, sendo 1 a frase que menos se associa ao conjunto das imagens anteriores, e 6 a que mais se associa a este conjunto:

- Podemos perceber muitas coisas comuns entre as diferentes imagens.

- As imagens levam a perceber que existe uma grande diversidade de culturas que cada vez mais se comunicam entre si.

- Mostram múltiplas formas de cultura e como elas mudaram ao longo do tempo.

- Têm pouco significado para nós, porque nem todas apresentam a nossa cultura.

- Revelam que diferentes culturas coexistem lado a lado, sem se influenciarem umas às outras.

- Ajudam a reconhecer que na humanidade há diversidade de culturas, mas também há aspectos comuns entre elas.

 

As sentenças, se ordenadas de acordo com as ideias de interculturalidade presentes nas investigações no campo da Educação Histórica, poderiam, a princípio, estar ordenadas de acordo com a sequência a seguir, variando da ideia menos associada à interculturalidade àquela que mais se aproxima deste conceito:

 

1 - pouco significado, porque nem todas apresentam a cultura dos jovens do grupo

2 - múltiplas formas de cultura e como elas mudaram ao longo do tempo

3 - há coisas comuns entre as imagens

4 - diferentes culturas coexistem lado a lado, sem se influenciarem umas às outras

5 – na humanidade há diversidade de culturas, mas também há aspectos comuns entre elas

6 - grande diversidade de culturas que cada vez mais se comunicam entre si

 

Partindo deste modelo prévio de gradação, analisamos de que forma os grupos associaram estas ideias às imagens utilizadas na tarefa anterior. Percebemos que a maioria dos grupos seguiu de forma aproximada a ordem das ideias projetada, mesmo que eles não tivessem contato com a mesma em nenhum momento do trabalho desenvolvido.

 

No entanto, quando partimos para a etapa final do trabalho é que percebemos as interpretações de cada estudante em particular, pois foi quando os desafiamos a elaborarem uma breve narrativa seguindo esta instrução: Escreva uma pequena narrativa, imaginando que estejas apresentando a cidade do Porto a um estudante de outro país, usando as informações das tarefas anteriores (imagens e frases enumeradas). Não é necessário usar todas as informações.

 

Neste momento, os vinte e quatro estudantes utilizaram os trinta minutos restantes da aula para escreverem as suas narrativas. A proposta, como se vê, foi a de que empregassem as fontes utilizadas nas tarefas anteriores (imagens e sentenças), bem como informações que considerassem importantes, mas que não tivessem sido mencionadas naqueles materiais.

 

A cidade do Porto ocupa grande parte das narrativas sobre o passado de Portugal, tendo sido palco de inúmeros acontecimentos que assumem a posição de marco histórico para a constituição tanto da história tradicional quanto daqueles que buscam novos referenciais teóricos e metodológicos.

 

Pensando nisso, buscamos compreender, nas narrativas elaboradas pelos estudantes desta turma de 9º Ano, especificamente, de que forma estas aprendizagens históricas podem influenciar nas representações que eles têm, na atualidade, sobre a cidade e as diferentes culturas que nela convivem. Além da presença de um vasto e reconhecido patrimônio histórico que o Porto oferece aos turistas, há também um conjunto de paisagens e atrações que vêm se adaptando e se ampliando nas últimas décadas, principalmente em função do boom do turismo.

 

Juntamente com este crescimento na atração de turistas do mundo inteiro, a cidade representa também um importante destino de imigrantes, que vêm para o Porto com diferentes motivações. Segundo relatório do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), em 2017 houve um crescimento de 14,1% de imigrantes no Porto, o que equivale a 27.486 estrangeiros que vieram se instalar e viver na cidade e arredores (Fonte: <https://sefstat.sef.pt/Docs/Rifa2017.pdf>. Acesso em: 7 abr. 2019).

 

Em Portugal, a nacionalidade mais representativa neste quadro de imigrantes corresponde aos brasileiros, equivalendo a 20,3% do total de pessoas que passaram a viver em diferentes regiões do país, segundo relatório da SEF de 2017. O gráfico a seguir identifica outras nacionalidades que compõem este cenário:

 



Fonte: Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), 2019.

Disponível em: <https://sefstat.sef.pt/Docs/Rifa2017.pdf>. Acesso em: 7 abr. 2019.


 

É preciso estimular os alunos a pensarem sobre esta realidade para que eles possam construir aprendizagens significativas, as quais contribuem para a convivência intercultural e o respeito a esta diversidade. As narrativas dos estudantes são excelentes meios para identificarmos estas ideias entre os alunos, auxiliando no mapeamento daquilo que eles pensam sobre a realidade. Este conhecimento serve como base para o professor planejar as estratégias de ensino e aprendizagem nas aulas de História.

 

Mas afinal, o que pensam estes alunos do 9º Ano sobre a cidade do Porto? Como as suas narrativas demonstram a perspectiva deles, adolescentes entre 14 e 15 anos, que vivem nesta realidade cotidianamente? Primeiramente, é interessante destacar que a maioria deles nasceu e cresceu na cidade, exceto uma estudante que é iraniana, dois cabo-verdianos e um polonês. A escola situa-se numa área urbana, dispondo dos níveis de ensino do 5º ao 9º Ano Regular, e do 10º ao 12º Ano (Disponível em: < http://site.aerfreitas.pt>. Acesso em: 10 abr. 2019).

 

Na totalidade dos aspectos mencionados pelos alunos, percebemos uma ênfase aos pontos considerados positivos na cidade, sendo raros aqueles que apontaram aspectos negativos. Em sua maioria, o turismo foi associado a algo bom para a cidade, e a imigração como um fator que incentiva a multiculturalidade, mas não necessariamente a interculturalidade.

 

De acordo com as narrativas dos estudantes, pudemos construir as seguintes categorias ou níveis em que elas poderiam se enquadrar para uma análise mais sistemática. Não pretendemos aqui propor classificações rígidas, mas apenas um esboço para que possamos viabilizar a compreensão da progressão das ideias sobre interculturalidade entre os alunos. Sendo assim, analisamos as narrativas de acordo com a seguinte categorização:

 

1. Perspectiva etnocentrada: nesta categoria, pudemos identificar um pequeno grupo de alunos que apresentou narrativas basicamente direcionadas à exaltação das qualidades da cidade e do país, cujos argumentos estão associados a uma visão etnocentrada em relação ao outro, que é percebido através de uma perspectiva objetivada. Enxergam o turista como um sujeito passageiro, sendo que a centralidade da cultura está naquilo que a cidade pode oferecer a este visitante. Não mencionam a presença de imigrantes em suas narrativas, as quais se referem a um tempo fixo e a um passado glorioso. Podemos identificar um exemplo deste tipo de ideias na seguinte narrativa: “No meu ponto de vista o Porto é considerado uma das melhores cidades da Europa e do mundo. É assim considerada, por causa da sua comida, cultura, clima e a sua grande segurança na cidade. Porto, como diz o seu nome, é uma cidade histórica porque Porto fica ao norte, e norte foi onde nasceu o meu grandioso Portugal [...]” (Tomé, 15 anos).

 

2. Descentração emergente: neste segundo nível de narrativa, a visão dos alunos está centrada no presente; o outro é o turista, assim como na outra categoria, mas já percebemos uma abordagem dinâmica do conceito de diversidade, ainda que oscilante. Identificamos um grupo mais significativo de alunos que apresentaram as suas narrativas com estas características. Eles mencionam a presença estrangeira e a diversidade, apontando para uma compreensão multicultural. Uma das narrativas que exemplifica esta categoria é a seguinte: “O Porto é uma cidade bastante cultural. É uma mistura de culturas com bastantes imigrantes, por exemplo, brasileiros, asiáticos e ingleses. Tem sítios bastante bonitos, como a Torre dos Clérigos e a Ponte Luiz I. Foi muito marcado pelos franceses, aliás, tem uma estátua na Rotunda da Boavista com uma águia e um leão, que simboliza os franceses. Tem as caves do vinho do Porto, vinho exportado para todo o mundo, mas principalmente para a Inglaterra [...]” (Carla, 14 anos).

 

3. Descentração: estes alunos construíram narrativas que já apresentam uma característica de descentração, reconhecem a diversidade e as influências das diferentes culturas na cidade do Porto. Demonstram compreender identidades associadas a aspectos do cotidiano (gastronomia, linguagem, artefatos, lugares e sujeitos), numa perspectiva ainda multicultural, mas já sinalizando para a interculturalidade. Aqui também pudemos identificar um significativo número de alunos, de cujas narrativas podemos destacar a seguinte: “Eu própria sou de um país estrangeiro, então sinto muitas diferenças entre o meu país e Portugal. Porto é uma cidade muito calma e segura e contém uma grande diversidade de culturas. Tem pontos turísticos como a Torre dos Clérigos e a Ponte Luiz I. É uma cidade pequena e isso mesmo faz dele uma cidade muito pacífica. Pessoalmente, gosto mais de andar nas ruas desconhecidas do Porto e me perder de propósito, em vez de visitar lugares turísticos” (Samira, 14 anos).

 

4. Descentração integradora: neste grupo, representado por um pequeno número de alunos, os aspectos positivos e negativos da cidade são relacionados ao nós. A visão do outro vai além do turista, captando também a presença do imigrante que passa a viver na cidade. O conceito de relação é central e se conecta com ideias de universalidade. Nas respostas destes alunos, são explícitas as ideias de interculturalidade em coexistência com outras que indiciam também uma forte identidade local. Como exemplo, podemos ler a seguinte narrativa: “O Porto é talvez o coração de Portugal. É um lugar importante para a história do país e acho que a maior parte de nós se orgulha de ser portuense [...]. O que ‘passa ao lado’ é talvez o preconceito [...]. Recebemos muito bem turistas, mas imigrantes é uma história diferente, e é por isto que considero que, apesar de diferentes culturas coexistirem em espaços próximos, e a população ter contacto com todas, elas não se influenciam ou não há ‘transferência de tradições’ de verdade” (Joana, 15 anos).

 

Em síntese, podemos avaliar que, quantitativamente, a maioria dos jovens que participaram dessa atividade expressaram ideias históricas na perspectiva etnocentrada ou descentrada emergente. Suas narrativas estão voltadas à caracterização turística da cidade do Porto, em meio às quais evidenciam traços do passado local, fazendo ligações com a história nacional ou mundial. Em seguida, uma minoria evidenciou ideias históricas descentradas ou descentradas integradoras, ampliando a sua narrativa para questões multi ou interculturais. 

 

A partir destas narrativas, mesmo que não tenham sido desenvolvidas a partir de um trabalho mais amplo e sistemático, é possível identificar ideias que se aproximam ou se distanciam do conceito de interculturalidade. E, quando há homogeneidade transversal nestas narrativas, há indícios de uma identidade coletiva orientada em determinado sentido. No caso das narrativas dos alunos desta turma de 9º Ano, especificamente, podemos perceber que há uma predominância de temas ligados às relações da cidade com o turismo, com a história e com os estrangeiros ou imigrantes. A experiência do cotidiano impele os sujeitos a buscarem referências no passado, onde poderão encontrar referenciais significativos para esta consciência histórica no presente. 

 

As narrativas dos estudantes, além disso, são oportunidades para que eles reflitam sobre as suas próprias ideias, como fez a aluna Joana, ao final da atividade desenvolvida na turma; ao se despedir, ela parou à porta da sala de aula e falou: “Fiquei a pensar... recebemos bem os turistas, mas não os imigrantes.” Ideias como estas podem nos levar a pensar as relações entre o turismo e a imigração, a partir dos conceitos de multiculturalidade e interculturalidade. A tendência das cidades turísticas, após alguns anos de crescimento desta atividade, é de provocar movimentos refratários entre a população local, dando origem a comentários como “o Porto já não é aquele que conheci há alguns anos”.

 

Já a imigração envolve outras relações em que a convivência e as trocas são duradouras; novos hábitos, novas linguagens e configurações espaciais alteram a paisagem e a vida cotidiana local. O cenário se altera e novas narrativas e novos sujeitos passam a fazer parte da cidade. A frase da aluna pode ser compreendida neste contexto em que há tendência em aceitar o multicultural, mas resistir ao intercultural.

 

Os movimentos turístico e imigratório recentes vêm se desencadeando principalmente nos últimos vinte anos na cidade, segundo dados do SEF. A hipótese de que tudo ainda é recente e poderá ser assimilado pela população mais jovem pode ser válida para explicar tais narrativas. A Educação Histórica busca construir aprendizagens significativas e qualitativas, que viabilizem a autonomia dos sujeitos, bem como o reconhecimento das identidades em meio a uma diversidade cultural crescente na contemporaneidade. Como ultrapassar a força etnocêntrica na compreensão intercultural deste cenário contemporâneo?

 

Voltamos, a partir destas reflexões, ao papel que o ensino de uma História Regional ou Local pode representar na formação de uma consciência histórica humanizada e humanizadora. Compreender as diferentes culturas que habitam e atuam em uma região ou localidade corresponde a uma oportunidade única de aprendizagem histórica, em que os sujeitos que ensinam e que aprendem podem lidar com os vestígios de um passado que, apesar de próximo, se conecta com outros passados, outras temporalidades e, acima de tudo, à humanidade. A diferença, antes vista como ameaça, se transmuta em possibilidade de conhecermos melhor a nossa própria identidade.

 

Referências biográficas

 

Dr. Cristiano Nicolini, professor da Faculdade de História – Universidade Federal de Goiás.

 

Referências bibliográficas

 

BARCA, Isabel. Educação Histórica: pesquisar o terreno, favorecer a mudança. In: SCHMIDT, M. A.; BARCA, I. (Orgs.) Aprender História: perspectivas da educação histórica. Ijuí: Ed. Unijuí, 2009.

 

______. O pensamento histórico dos jovens: ideias dos adolescentes acerca da provisoriedade da explicação histórica. Tese de Doutoramento - Universidade de Londres. Universidade do Minho: Braga, 2000.

 

______. Narrativas históricas de alunos em espaços lusófonos. In: BARCA, Isabel (org.). Consciência Histórica na Era da Globalização. Centro de Investigação em Educação. Universidade do Minho: Braga, 2011.

 

______. Consciência Histórica de Jovens: Identidade, Mudança em História e Sentidos para Vida. Cadernos de Pesquisa: Pensamento Educacional, Curitiba, v. 9, n. 21, p.86-107 jan./abr. 2014. Disponível em: <http://www.utp.br/cadernos_de_pesquisa/>. Acesso em: 20 mar. 2019.

 

BARROS, José D'Assunção. A Expansão da História. Petrópolis: Editora Vozes, 2013.

 

CASTRO, Júlia I.C.C.A. de. A interculturalidade como categoria da consciência histórica um estudo com jovens portugueses. Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009.

 

______. “Gente em movimento ao longo do tempo”: ideias de interculturalidade e consciência histórica de jovens portugueses. In: BARCA, Isabel (org.). Consciência Histórica na Era da Globalização. Centro de Investigação em Educação. Universidade do Minho: Braga, 2011.

 

CORRÊA, Roberto Lobato. Região: a tradição geográfica. In: CORRÊA, Roberto Lobato. Trajetórias Geográficas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997.

 

DUARTE, Luís Miguel. História do Porto. Porto: Edições ASA, 2001.

 

EURODICAS TURISMO. Disponível em: <https://turismo.eurodicas.com.br/porto-eleito-o-melhor-destino-da-europa/>. Acesso em: 28 mar. 2020.

 

LENCIONE, Sandra. Região e Geografia – a noção de região no pensamento geográfico. In: CARLOS, Ana Fani. Novos Caminhos da Geografia. São Paulo: Contexto, 2001.

 

RÜSEN, Jörn. Teoria da história: uma teoria da história como ciência. Trad. Estevão C. Rezende Martins. Curitiba: Editora UFPR, 2015.

 

______. Cultura Faz Sentido: orientações entre o ontem e o amanhã. Trad. Nélio Schneider. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.

 

SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS (SEF), Portugal, 2019. Disponível em: <https://sefstat.sef.pt/Docs/Rifa2017.pdf>. Acesso em: 7 abr. 2019.



12 comentários:

  1. O debate sobre a interculturalidade me proporcionou muitas reflexões, especialmente o relato da aluna Joana. Seria correto afirmar ou mesmo foi possível enxergar traços xenófobos entre os estudantes, a partir dos relatos?
    Lucilia Maria Esteves Santiso Dieguez

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    1. Oi, Lucília! Obrigado pela leitura! Como o contato com a turma foi bastante breve, não pude identificar nas escritas e nas falas deles e delas evidências de xenofobia. No entanto, em conversa com a professora da turma, ela relatou que havia, sim, casos envolvendo um estudante da turma e colegas africanos. No entanto, durante a atividade realizada e os diálogos com a turma, essas manifestações não apareceram em momento algum (pelo menos não pude perceber). De fato, é um tema delicado e exige uma convivência contínua com a turma para que as narrativas revelem aspectos ligados à xenofobia. Além disso, há sempre aquela dimensão do não dito, a que nós professores/as e historiadores/as buscamos estar sempre atentos/as.
      Abraços!
      Cristiano N.

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    2. Oi, Cristiano!
      Muito obrigada pelo retorno. De fato acredito que, a convivência contínua e o desenvolvimento do processo de aprendizagem, construídos entre docentes e discentes, contribuirão bastante para revelar e ainda desconstruir os aspectos discriminatórios. Por isso seu texto apresenta traços muito significativos no aspecto das mentalidades e da aprendizagem histórica.

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  2. Os aspectos sobre regionalidade automaticamente me direcionaram à experiência no Ensino Básico na cidade do Rio de Janeiro. A cidade recebe vários migrantes da Região Nordeste do país e é clara a discriminação entre os estudantes, atribuindo aos recém chegados pontos negativos. Você acha que a fala da estudante " O Porto não é aquele que conheci há alguns anos" tem relação à experiência que descrevi? É possível relacionar ou não?
    Lucilia Maria Esteves Santiso Dieguez

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    1. Olá! Sim, percebo que essas narrativas expressam traços de uma cultura histórica que, apesar de não explicitar xenofobia explicitamente, como me referi na resposta anterior, acaba revelando os "não ditos" nas entrelinhas ou então de forma não direta. Ao comparar o Porto de hoje com "aquele não existe mais", fica entendido que a mudança nem sempre é associada a algo positivado. Percebo que as narrativas sobre as regionalidades, em muitos casos, tendem a identificar esses "outros" como elementos perturbadores de um passado que, supostamente, fora melhor. Por isso é tão necessário conhecermos essas ideias sobre o lugar onde as crianças e jovens vivem, pois elas produzem fontes indispensáveis para pensarmos numa educação histórica intercultural.
      Abrçs e grato pelo diálogo!
      Cristiano Nicolini

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  3. Cristiano, eu que agradeço pelo diálogo. A construção do pensamento se faz no coletivo e seu texto contribui muito para isso. Ao pensarmos nos discursos de "um passado que fora melhor", evidenciamos e associamos às falas de muitos brasileiros nos tempos atuais, que sempre referenciam o passado de forma "maravilhosa". Super importante pensarmos que lugares as pessoas constroem com essas falas, não é mesmo? Que continuemos a trabalhar pela multiculturalidade para construir a interculturalidade.
    Grande abraço!
    Lucilia Maria Esteves Santiso Dieguez

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  4. Cristiano, parabéns por um texto tão bonito, que nos permite vislumbrar nas práticas da sala de aula, as possibilidades da educação histórica para a interculturalidade. O texto é simples, envolvente e nos desperta a sensação de estarmos observando a experiência narrada. Admiro muito seu trabalho por essa associação sempre marcante entre método e sensibilidade para a humanização. Gostaria de saber como foi o processo de categorização das narrativas. Obrigada.

    Kenia Gusmão Medeiros

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    1. Obrigado pela leitura, Kênia.

      Para categorizar as narrativas, primeiramente eu e a orientadora, Profª Isabel Barca, fizemos uma leitura atenta de todo o material e fomos anotando todas as incidências, conceitos e também aquilo que "não é dito" no dito. A partir desse mapeamento inicial, fomos organizando em tabelas as tipologias mais evidentes e enfim sintetizamos nas quatro categorias visando a apresentação para o leitor. Obviamente, essa categorização reflete apenas parte de uma investigação, que no campo da Educação Histórica é compreendida de forma processual; ou seja, é sempre uma pesquisa em aberto... se fosse viável, eu voltaria até a escola para dar sequência a essa investigação, analisando os quatro tipos que identificamos na primeira etapa; porém, em função da situação e dos prazos, infelizmente parou na etapa 1. Isso que instiga na Educação Histórica, pois um trabalho dá abertura para que outras pessoas possam dar sequência, seja naquele local ou outros contextos. No meu caso, essa pesquisa-piloto auxiliou bastante na formatação da minha pesquisa no Brasil... foi uma experiência metodológica que ampliou em muito a minha compreensão sobre processos de aprendizagem histórica.

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  5. Excelente pesquisa e texto, professor Cristiano Nicolini!
    Antes de te perguntar, gostaria de destacar o seu questionamento e a sua conclusão:"Como ultrapassar a força etnocêntrica na compreensão intercultural deste cenário contemporâneo?" Em resposta você argumenta que: "A diferença, antes vista como ameaça, se transmuta em possibilidade de conhecermos melhor a nossa própria identidade". De fato, nos discursos interculturais as diferenças projetam um reconhecimento de si, entretanto, te pergunto: Como estabelecer uma educação histórica intercultural como caminho humanizador para crianças que recebem de seus país uma educação conservadora e desumanizadora?

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    1. Obrigado pela leitura e pela questão, Álvaro!

      Essa talvez seja uma das questões mais desafiadoras para nós, professores/as e historiadores/as, considerando que a cultura histórica revela uma recorrência bastante intensa a essa educação conservadora e desumanizadora. Sinto que em tempos recentes tivemos uma leve ilusão de que estávamos superando algumas dessas forças do passado, mas hoje percebemos que ele não passa assim tão de repente... atuamos entre camadas de passado, entre estratos de tempo, como diria Koselleck. Por isso, talvez tenhamos que construir propostas de ensino que partam justamente do que os alunos e as alunas sabem (das suas aprendizagens, narrativas e ideias prévias), para que saibamos quais desses estratos de tempo estão presentes na turma, na escola, na realidade em que atuamos. Essa cultura histórica não pode ser negligenciada quando nos propomos a ensinar História na perspectiva intercultural, para que possamos atuar nas fendas que existem entre essas camadas. Não vejo isso como receita, mas talvez possa ser um manual de sobrevivência em tempos de neofascismo, necropolíticas e outros ISMOS que volta e meia ressurgem para negar a perspectiva humanista/humanizadora em nome de projetos como esse que experimentamos no Brasil 17. O estudo apresentado tem essa intenção e motivação: mapear o campo onde pisamos, para a partir disso pensar em aulas históricas que problematizem as narrativas mestras e, quem sabe, motivem novas consciências históricas menos eurocêntricas, menos racistas, menos individualistas e menos desumanizadoras.

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    2. Obrigado pela resposta, fico feliz em não estar sozinho em meio a esse turbilhão. E mesmo que não tenhamos uma receita, a educação nos oferece, como você bem disse, uma forma de pensar para além dos ismos.

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